A função reprodutiva dos seres humanos é um processo delicado, complexo e intenso. Qualquer alteração na dinâmica hormonal, órgãos e estruturas do sistema reprodutivo de homens e mulheres pode resultar em infertilidade conjugal.
Entre as principais causas de infertilidade feminina, as doenças que prejudicam o funcionamento dos ovários despontam como algumas das enfermidades mais recorrentes.
Os ovários são as glândulas sexuais das mulheres, se manifestam aos pares e estão localizadas nas extremidades das tubas uterinas, que ligam os ovários ao útero. Essas glândulas desempenham funções relacionadas principalmente à dinâmica dos hormônios sexuais e com a reserva ovariana.
As doenças que afetam os ovários normalmente produzem cistos, que prejudicam a fertilidade, embora de formas diferentes e com urgências distintas.
Enquanto na SOP (síndrome dos ovários policísticos) os cistos são formados por folículos atrésicos, que permanecem do mesmo tamanho e afetam apenas a ovulação, os cistos típicos da endometriose ovariana – os endometriomas – são compostos de endométrio ectópico e sangue, aumentam de tamanho sob influência dos estrogênios e podem romper-se – configurando um quadro mais grave e urgente, que afeta a reserva ovariana, além da ovulação.
Nos acompanhe na leitura do texto a seguir e compreenda melhor o que são os endometriomas e como estes cistos podem afetar o sonho da maternidade para muitas mulheres.
Os endometriomas são os cistos formados pela endometriose do tipo ovariana, caracterizados principalmente por sua coloração vermelho achocolatada e por responderem à ação dos hormônios sexuais, principalmente os estrogênios e a progesterona.
Num ciclo reprodutivo normal, os hormônios ovarianos – com destaque para os estrogênios e a progesterona – são produzidos em resposta aos estímulos hipofisários mediados pelas gonadotrofinas LH (hormônio luteinizante) e FSH (hormônio folículo-estimulante), e atuam principalmente nos ovários e no útero.
Nos ovários, os estrogênios participam da liberação do oócito, na ovulação, enquanto esse hormônio atua também no espessamento do endométrio, induzindo à multiplicação celular deste tecido, que aumenta de tamanho.
A progesterona é produzida nos ovários pelo corpo-lúteo – formado pelas células foliculares residuais, após a ovulação – e seu papel principal é uterino, paralisando a multiplicação celular do endométrio, induzida anteriormente pelos estrogênios, e reorganizando este tecido.
A receptividade endometrial é resultado das ações orquestradas desses dois hormônios, que preparam o útero para receber o embrião, caso a fecundação ocorra, no interior das tubas uterinas.
Se a fecundação não ocorrer, a concentração destes dois hormônios decai, provocando a descamação do endométrio, que é expelido em forma de sangue menstrual, recomeçando o ciclo reprodutivo.
Os focos endometrióticos respondem aos estímulos dos estrogênios e da progesterona de forma semelhante ao endométrio original, porém a multiplicação celular desencadeada pelos estrogênios, nestes casos, provoca o aparecimento de um processo inflamatório local, que prejudica o funcionamento das estruturas às quais estão aderidos os implantes.
Como a secreção de progesterona é sensivelmente mais baixa e menos constante que a de estrogênios, predomina a ação deste último hormônio e, consequentemente, o crescimento dos focos endometrióticos é maior que o controle da progesterona sobre eles.
A fisiologia dos endometriomas é semelhante aos demais tipos de endometriose, com a diferença de o tipo ovariano formar um tecido endometrial ectópico envolto em membranas, constituindo o cisto do qual falamos anteriormente.
Os processos inflamatórios locais, desencadeados pelos endometriomas, e o próprio crescimento dos cistos pressionam o córtex ovariano, danificando as células que compõe a reserva ovariana e também a ovulação – processos implicados na infertilidade decorrente desse tipo de endometriose.
Apesar de os endometriomas raramente se manifestarem de forma isolada, sendo mais comumente acompanhados das outras formas de endometriose – superficial peritoneal e infiltrativa profunda – a infertilidade é considerada o sintoma mais central deste tipo de endometriose.
Contudo, é importante ressaltar que qualquer forma de endometriose oferece risco para o desenvolvimento de todos os sintomas típicos da doença, como estes:
De forma geral, podemos dizer que os prejuízos às funções urinária e intestinal acontecem principalmente quando os focos endometrióticos estão localizados no peritônio ou no períneo.
É importante lembrar também que a endometriose, inclusive sua forma ovariana, é uma doença crônica e progressiva. Assim, o crescimento dos endometriomas pode levar ao rompimento dos cistos, o que provoca dor pélvica aguda e demanda que a mulher procure atendimento médico imediatamente.
O diagnóstico dos endometriomas é realizado principalmente a partir dos resultados da ultrassonografia pélvica transvaginal com preparo intestinal, uma modalidade específica entre as ultrassonografias pélvicas, própria para os diversos tipos de endometriose.
O esvaziamento intestinal permite que a ultrassonografia forneça imagens mais claras e objetivas da cavidade pélvica, já que as ondas de ultrassom conseguem ecoar no interior dos intestinos sem que o bolo fecal interfira na formação das imagens, além de evitar que o inchaço intestinal forme imagens que podem ser interpretadas de forma incerta, após o resultado.
Atualmente, os endometriomas e a endometriose como um todo podem ser tratados por três principais abordagens, segundo algumas especificidades de cada caso: medicamentosa, cirúrgica e pela reprodução assistida.
O tratamento medicamentoso é feito com a administração de medicamentos contraceptivos orais, que combinam doses específicas de estrogênio e progesterona, e têm como principal objetivo controlar os sintomas dolorosos, embora este tratamento não seja indicado para mulheres que desejam engravidar a curto prazo.
O tratamento cirúrgico consiste na retirada dos focos endometrióticos via videolaparoscopia, contudo a indicação da cirurgia para os endometriomas deve ser feita de forma muito cuidadosa. Isso porque a intervenção cirúrgica, da mesma forma que a doença, pode afetar a reserva ovariana e com isso prejudicar ainda mais a fertilidade das mulheres com endometriomas.
Nesse sentido, a infertilidade provocada pelos endometriomas pode ser mais adequadamente tratada através das técnicas de reprodução assistida disponíveis atualmente.
Entre os principais procedimentos, a FIV (fertilização in vitro) é aquele que mais oferece chances de gestação para mulheres com distúrbios anovulatórios, como os desencadeados pelos endometriomas.
Essa indicação é feita porque a FIV inclui a estimulação ovariana e porque possibilita a preservação da fertilidade pelo congelamento de óvulos, antes da cirurgia para retirada dos endometriomas, caso haja essa indicação.
Na estimulação ovariana, realizada nos primeiros dias do ciclo reprodutivo, a mulher recebe doses diárias de medicamentos à base de gonadotrofinas, que induzem o recrutamento e amadurecimento dos folículos.
Após a estimulação ovariana, os gametas femininos são coletados e podem ser encaminhados imediatamente para fertilização, ou podem ser congelados para que a fecundação aconteça posteriormente.
É importante relembrar que os endometriomas raramente se manifestam de forma isolada, sendo normalmente acompanhados por outras formas de endometriose, que oferecem inclusive riscos de gestação ectópica, principalmente tubária.
Nesse sentido a FIV também funciona como uma forma de prevenir esse tipo de gestação, que além de resultar em perda gestacional, também oferece risco de morte para mulher.
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